Por Humberto Carvalho Jr.
No início desta semana, o presidente Lula foi chamado às falas novamente pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Por meio de sua assessoria, Mendes confirmou que criticou as ocupações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-terra como chefe do Judiciário, e não como “cidadão” conforme acreditava o presidente.
Na quarta-feira (25), quatro dias depois do conflito em que quatro pistoleiros foram mortos por integrantes do movimento em uma fazenda localizada no município de São Joaquim do Monte (a 130 km de Recife) no sábado (21), o presidente do STF convocou entrevista coletiva, para criticar o MST. Mendes, acostumado a opinar sobre tudo e todos, condenou as ocupações em São Paulo e Pernambuco, e disse que os repasses de verbas ao movimento são ilegais.
Há quem se arrisque jogar pedra em cobertura alheia com tamanho telhado de vidro. O ditado é velho, mas não obsoleto. Só para lembrar, de acordo com reportagem da revista Carta Capital publicada em outubro de 2008, Gilmar Mendes tem participação no controle acionário do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), entidade que faturou, entre 2000 e 2008, cerca de R$ 2,4 milhões de reais em contratos com órgãos ligados ao governo federal, todos firmados sem licitação. O IDP também recebeu benefícios fiscais do governo do Distrito Federal.
Como um chefe do Judiciário "que tem responsabilidades políticas e institucionais inerentes ao cargo", Mendes deveria ter aproveitado a reunião com a mídia para explicar suas motivações para conceder, e tão rapidamente, liberdade ao banqueiro corrupto Daniel Dantas, grande financiador de campanhas eleitorais e aliciador da grande imprensa corporativa.
Em resposta às declarações do presidente do STF, segundo o jornalista Ricardo Noblat, o MST ocupou as fazendas Espírito Santo e Cedro, propriedades da Agropecuária Santa Bárbara, uma das empresas do Grupo Opportunity, pertencente a Daniel Dantas. O MST confirmou a ocupação da fazenda, mas negou que os funcionários estejam impedidos de entrar ou sair. O movimento também negou a denúncia da assessoria da empresa de que houve "matança de gado".
Para o coordenador nacional do MST, João Pedro Stedile, Gilmar Mendes, além de ter assumido o papel de porta-voz da direita, passou a criticar as ocupações somente depois que se agravou a relacionamento entre os sem-terra e a administração do governador paulista, José Serra (edição atual de Carta Capital). “Desde que assumiu (no STF), ele (Mendes) ataca os povos indígenas, os quilombolas, os direitos dos trabalhadores, dos operários. Defende os militares da ditadura. Enfim, a direita brasileira já tem o seu Berlusconi tupiniquim“, disse Stedile, em entrevista por telefone concedida a Paulo Henrique Amorim”. Leia o texto na íntegra aqui.
O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) publicou nota em repúdio às declarações do ministro Gilmar Mendes. “Nunca a sociedade brasileira ouviu do Ministro uma condenação aos grupos de latifundiários armados no campo ou a concessão de financiamentos públicos aos grandes grupos econômicos, que tem provocado o trabalho escravo, chacinas contra populações tradicionais e crimes ambientais. Dessa forma, o senhor Ministro Gilmar Mendes, estimula o processo de criminalização dos movimentos sociais e sindicais, unindo e fortalecendo politicamente os setores que atuam no sentido contrario à consolidação de uma sociedade livre, organizada e democrática”, condena.
Certamente, as mortes dos capangas não têm justificativas. Porém, fica difícil discordar quando o FNRA afirma que a violência no campo é resultado da morosidade do governo federal para promover a reforma agrária. Segundo o grupo, atualmente existem cerca de 250 mil famílias de sem-terras acampadas nas beiras das estradas. “Os recursos orçamentários da União destinados para a reforma agrária não dão conta desta demanda, apesar de estar comprovado que o Estado possui recursos suficientes para realizar a reforma agrária em menos de três anos. Adiar este processo significa promover e estimular a violência no campo, colocando em risco a vida de milhares de famílias brasileiras”, explica. Leia mais aqui.
O deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), integrante da Frente Parlamentar da Terra no Congresso Nacional, afirmou nesta terça-feira (3) que Gilmar Mendes, deve se declarar impedido de julgar qualquer ação relativa ao MST. Dr. Rosinha cita o artigo 36 da lei complementar 35, em vigor desde 1979, que estabelece o seguinte: "É vedado ao magistrado [...] manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem[...]."
Em Pernambuco - O MST continua acampado na Fazenda Jaboticaba, cenário do assassinato dos quatro pistoleiros, e segundo a direção do movimento as famílias só deixarão a área depois que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária em Pernambuco (Incra-PE) garantir que vai realizar a medição do terreno.
Segundo o MST, após o último despejo realizado pela Polícia Militar, o fazendeiro contratou pistoleiros que foram no acampamento fazer provocações, armados. Perseguiram e espancaram um dos líderes do acampamento. Para a polícia, os homens tentavam tomar fotografias feitas por sem-terra, que os mostram armados circulando pelo terreno. Veja as fotos abaixo.
No mesmo dia, dois sem-terra foram presos em flagrante, Aluciano Ferreira dos Santos, 31 anos, e Paulo Alves Cursino, 62, que serão indiciados por homicídio qualificado por motivo fútil. O resultado do exame de resíduo gráfico feito nesta segunda-feira, (2) pelo Instituto de Criminalística deu negativo para disparo de arma por Aluciano, o que não o isenta de ter utilizado uma arma ou participado do crime.
O coordenador do MST em Pernambuco, Jaime Amorim, ao saber das declarações do presidente Lula, que considera “inaceitáveis” as mortes, disse que cada um tem direito de opinar sobre o caso, desde que conheça os fatos. “Lula tem o direito de exercer sua opinião. Mas, certamente, não disseram ao presidente que, na região, tem uma quadrilha fortemente armada que presta serviços aos fazendeiros. Certamente, não disseram também a Lula que o pessoal foi até o assentamento para matar os trabalhadores.”
Amorim defende ainda a tese de legítima defesa, mas admite exagero. “Acredito que os trabalhadores se defenderam. Nas duas últimas mortes (quando seguranças foram perseguidos pelos sem-terra e depois executados) acho que pode ter ocorrido um exagero. Mas, creio que eles pensaram que os dois iriam chamar outros pistoleiros para voltar ao acampamento e massacrar os trabalhadores”, avaliou.
Os sem-terra reivindicam as fazendas Consulta e Jabuticaba, em São Joaquim do Monte, alvo de nove reintegrações de posse. Dois dias antes do conflito, eles haviam sido despejados da Jabuticaba, mas a reocuparam. O líder do MST em Pernambuco, Jaime Amorim, afirmou que cerca de 80 famílias de sem-terra continuam acampados dentro da fazenda Jabuticaba. O trato com o Incra, segundo ele, é de só deixarem a propriedade depois que o proprietário autorizar vistoria. Segundo o Incra, o proprietário diz que a área não chega a 250 hectares. O MST afirma que a área é improdutiva e tem em torno de 800 hectares.
Lembra?
Massacre do Eldorado dos Carajás - Em 1996, a ação da Polícia Militar do Pará deixou dezenove pessoas mortas na hora, outras duas morreram anos depois, vítimas das seqüelas, e outras sessenta e sete ficaram feridas. O legista Nélson Massini, que fez a perícia dos corpos, disse que pelo menos 10 foram executados. Sete lavradores foram mortos por instrumentos cortantes, como foices e facões.
Acusado pelo fazendeiro Ricardo Marcondes de Oliveira de ter recebido propina do proprietário da Fazenda Macaxeira para matar os líderes dos sem-terra, o coronel Mário Pantoja, comandante da PM de Marabá, responsável pela operação que resultou no massacre, apenas foi afastado, ficando 30 dias em prisão domiciliar e depois liberado, por determinação do governador do Estado, Almir Gabriel (PSDB).
Nenhum fazendeiro ou jagunço foi indiciado no inquérito da Policia Civil, mas esta testemunha foi indiciada por falso testemunho. Na ocasião, o advogado Juvelino Strozake, do MST, em São Paulo, reagiu afirmando "que só está faltando o delegado indiciar os 19 lavradores que foram mortos pela polícia".
2 comentários:
Quem é Gilmar Mendes? Essa é a primeira pergunta que deve ser feita sobre o inoportuno presidente do STF. Mendes é hoje um dos principais porta-vozes da direita nacional, e usa o cargo para tal. Escondendo-se na toga, arvora-se a julgar tudo e todos conforme suas convicções ideológicas. Da mesma forma critica os movimentos sociais, ele solta o banqueiro Daniel Dantas duas vêzes, por puro sentimento de classe. Mendes é um estupro constitucional institucionalizado na corte, na mais alta corte do país.
Valeu a dica, Humberto! Já coloquei o banner no meu blog.
Postar um comentário