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terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Aécio Neves e a mídia: repeteco de uma fábula

Por Humberto Carvalho Jr.

Ganha um chocolate quem conseguir encontrar uma notícia negativa sobre o governador mineiro Aécio Neves publicada por veículos da grande mídia brasileira. Depois de tão improfícua busca, você constatou que, até as eleições presidenciais de 2010, ainda terá de ler, ver e ouvir todo um festival de baboseiras que enalteçam a figura deste super-herói tucano, caso contrário estaríamos desprezando a experiência das grandes empresas de comunicação deste país de construir, a exemplo de Fernando Collor de Mello, o presidente ideal.

Deixando de lado o pessimismo inerente ao tema, afirmaria com a tranqüilidade e o desdém de um ateu que lê em voz alta um trecho do Apocalipse: “piores dias virão”. Visibilidade, ao menos, não será problema para Aécio Neves construir sua imagem de presidenciável quimérico. A ‘disposição’ do pré-candidato está fazendo rima pobre com a ‘ambição’ do setor midiático. Interesses em comum. Nada mais é necessário para explicar a relação de cordialidade entre o jovem governador de sorriso afável e a grande mídia tupiniquim.

Na última segunda-feira (01), o governador tucano de Minas Gerais declarou que “o PSDB cansou de perder eleições”, atribuindo as últimas derrotas ao centralismo da cúpula do partido. Para o jornal Folha de S. Paulo, “não foi a primeira vez que Aécio Neves criticou as decisões da cúpula, incluindo-se entre os caciques centralizadores. Mas foi a primeira vez que ele atribuiu as derrotas eleitorais a essa centralização” (Nossa, como ele é honesto!).

No início de 2007, o jornal francês Le Monde, sob o título “Aécio Neves na disputa pelo pós-Lula”, publica um perfil do pré-candidato tucano, à época reeleito como governador de Minas Gerais. Aécio é descrito pelo jornalista Annie Gasnier, autor do perfil, como um príncipe dos contos de fada ávido por desflorar a sua “Gata Borralheira” logo no primeiro ato.

 “O seu sorriso charmoso, enquadrado por covinhas, suscita uma simpatia espontânea. Em 1º de outubro, este sorriso refletia o orgulho: o jovem governador de Minas Gerais foi reeleito com 73% dos votos. Um resultado que mais parece um plebiscito de aclamação para o seu segundo mandato, para o qual Aécio Neves acaba de tomar posse neste início de janeiro”, publicou o Le Monde.

Por aqui, em Banana Land, a imprensa gorda não perdeu a farra. A folhona (Se preferir a forma mais tradicional, Folha de S. Paulo), dois dias depois, noticiou um curto comentário sobre o perfil publicado pelo diário francês sob o título "Monde vê Aécio como nome forte para disputa presidencial”. A informação de que o jovem governador mineiro é acusado de censurar a imprensa em seu estado foi suprimido pela importância de seu sorriso, inato disseminador de encanto. Afinal, como disse Aécio para o jornalista do Le Monde: “Ser presidente não é um plano de carreira, e sim uma questão de destino”.

A denúncia de censura à imprensa no estado mineiro surgiu do documentário Liberdade: essa palavra, produzido pelo jornalista Marcelo Baêta como seu trabalho de conclusão de curso de Jornalismo pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 2006. Através de entrevistas com os profissionais censurados (alguns demitidos), o vídeo revela as manobras da mídia para forjar a imagem de Aécio Neves como um bom gestor (talvez, o melhor).



Além de gerar diversas matérias em veículos alternativos, o vídeo foi mencionado na matéria do Le Monde e inspirou outro documentário, Gagged In Brazil. Produzido pelo brasileiro radicado em Londres, Daniel Florêncio, por encomenda da Current TV, o vídeo foi bastante assistido em canais abertos nos Estados Unidos e Inglaterra. Assista-o agora (abaixo), pois no Brasil isso não vai acontecer.



De acordo com o jornalista Vilmar Berna, em artigo no website Viomundo, mais de 270 políticos são sócios, proprietários ou diretores de emissoras de rádio e TV. “Este número, porém, corresponde apenas aos políticos que possuem vínculo direto e oficial com os meios de comunicação – não estão contabilizadas as relações informais e indiretas (por meio de parentes e laranjas), que caracterizam boa parte das ligações entre os políticos e os meios de comunicação do país”, concluiu.

Fica claro porque a mídia repele, com bordões desgastados, os diálogos sobre regulamentações e democratização dos meios de comunicação, além de evidenciar o motivo pelo qual o Brasil ocupa 82º lugar na lista de países com liberdade de imprensa, segundo pesquisa publicada pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras.  

 Com o Palácio da Liberdade promovendo a censura, só me resta sugerir a trilha sonora. Como tema deste episódio, você ouvirá a música Contraste, interpretada por Luiz Melodia.


Luiz Melodia - Contrastes


Tradução de trechos do perfil publicado no Le Monde: Jean-Yves de Neufvill

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